Bae.
O nome, que um dia já tinha sido tão importante em sua vida, agora deixava Alistair enfurecido.
O tio Bae estivera tão perto. Do outro lado da rua!
Não era o momento certo, Alistair lembrou a si mesmo. Ele teria que esperar. Era necessário planejar.
Ele se virou para olhar seus companheiros de voo. Os Kabra assistiam a um episódio antigo de The O.C. nas telas individuais em frente de suas poltronas, enquanto os irmãos Cahill faziam as palavras cruzadas da revista de bordo.
Em silêncio, ele desdobrou a folha que tinha imprimido na biblioteca. Ao longo de toda a sua vida, Alistair gastara uma fortuna com detetives particulares, à procura do homem que havia tirado dele o que ele possuíra de mais valioso. Agora a identidade do homem tinha sido descoberta. Morrera de velhice... Um senhor respeitável que secretamente tinha feito a sua fortuna como assassino de aluguel, mantendo em um cofre o relatório de cada serviço prestado ao longo da vida. Ao que parecia, ele havia guardado todos os documentos referentes ao seu trabalho.
Alistair esticou o papel na mesinha do assento. Com os dedos trêmulos leu, pela centésima vez, o que estava escrito:
Alistair se forçou a ler aquilo novamente, represando a náusea e a raiva.
Cinco mil dólares.
A vida do pai dele por 5 mil dólares.
Os detalhes do que acontecera em Nova York estavam soldados no cérebro de Alistair. Ele ainda carregava consigo o recorte de jornal carcomido, amarelado, noticiando o assassinato: “Nova York, 12 de maio de 1948. O empresário coreano Gordon Oh foi morto no cruzamento da avenida Madison com a rua 45, a caminho do teatro.”
Eis o que toda a imprensa dizia: uma loja de ternos arrombada, um alarme disparando, o ladrão desesperado subindo a avenida a toda velocidade com um revólver na mão e tentando render um carro parado num sinal vermelho – a limusine alugada de seu pai. O senhor Oh tentara dominar o homem. Lutara com bravura, mas perdera a vida tragicamente. O atirador tinha escapado e jamais foi encontrado.
Seu pai estava no lugar errado, na hora errada. Um acidente infeliz. Aquela era a versão oficial.
Quando criança, Alistair nunca suspeitou que aquilo tivesse sido um serviço encomendado. Às vezes, no entanto, acidentes eram planejados e matadores, contratados. Ele sempre teve medo de seu tio Bae Oh, irmão gêmeo do pai. Bae, o irmão preguiçoso, ganancioso, sempre fazendo corpo mole, tantas vezes rejeitado para a chefia da família Ekaterina, eternamente à sombra de seu irmão, o vigoroso e querido Gordon. Quando adulto, Bae só sabia jogar sujo, sendo tão inescrupuloso quanto um Kabra em suas transações comerciais.
Bae tinha sede de glória e riquezas... e das 39 pistas. Qualquer um que atrapalhasse seu caminho precisava ser eliminado. Até mesmo se fosse seu próprio irmão.
Não importava que Gordon tivesse, do outro lado do mundo, uma esposa que, de tanta tristeza, precisou ser hospitalizada. Ou um filho de 4 anos, cujo coração foi arrancado do peito no dia da morte do pai.
Um menino triste e sozinho, que acabou sendo criado por um homem com coração de vidro, que o ignorou e humilhou a vida inteira.
Seu tio Bae Oh. O mandante do assassinato.
Alistair olhou de relance para os irmãos Cahill. Eles estavam discutindo alguma resposta das palavras cruzadas, a conversa virando uma piada, o menino inventando alguma palavra sem sentido, depois um jorro de palavras sem sentido, uma explosão de gargalhadas. Ainda pareciam as mesmas crianças de onze anos atrás, um recém-nascido e uma menina de 3 anos. Na época em que Alistair fizera aquela promessa para Hope e Arthur. Uma promessa quase impossível de ser cumprida.
As crianças não deviam lembrar, é claro. Mas ele lembrava. E agora o casal estava morto, pelo mesmo motivo que o fez perder os próprios pais. Pelas 39 pistas.
Ele deu um suspiro. Pelo menos os irmãos tinham um ao outro. A única esperança de Alistair era a vingança.
Seus dedos tremiam enquanto ele dobrava a folha e a colocava de volta no bolso. Naquele voo, ele sabia que não ia dormir.
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